quarta-feira, 24 de junho de 2009

Antropologia Cristã

CAPÍTULO 1

I – ANTROPOLOGIA CRISTÃ

I.1 – Definições

I.1.a – Definição de Antropologia (Secular)

A antropologia é uma ciência que se propõe estudar sistematicamente a cultura dos povos. A palavra cultura vem da antiga tradição de cultivar o solo, dessa forma, podemos considerar que cultura é a forma que a sociedade, tribo, ou povo se organiza e se comporta para garantir a sua sobrevivência. Portanto a Antropologia se ocupa no estudo das diferenças culturais com que as pessoas sentem, observam, explicam, comparam, controlam, pensam e agem dentro de um determinado grupo. Podemos dizer também que ela estuda os valores, costumes, tradições convicções e hábitos específicos de um grupo.

I.1.b – Definição de Antropologia Cristã

A antropologia cristã estuda o homem tendo em vista que é um ser espiritual, criado à imagem e semelhança de Deus e possui um sentido eterno em sua existência. Tem sua base na Palavra de Deus e olha o homem pelo prisma bíblico.

I.2 – História

I.2.a – História da Antropologia Comum

Muitos relacionam o início da Antropologia ao grego Heródoto, que viveu no século V a.C. e foi chamado de Pai da Antropologia. Entretanto se formos considerar a Antropologia como o estudo do homem em meio ao emaranhado de relações sócio-culturais que ele vivencia, fica difícil um possível marco histórico. Uma vez que é antigo o interesse do ser humano em compreender os costumes e mecanismo de funcionamento dos grupos nos seus movimentos entre culturas. Nele ele montem contato com línguas, tradições, costumes, hábitos, religiões e conceitos sociológicos diferentes.

Para a maioria dos autores, o princípio da antropologia aponta para a antiguidade greco-romana. No entanto percebe-se que o interesse por conhecer e estudar sistematicamente os povos desconhecidos para o mundo europeu surgiu com o avanço das Grandes Navegações e o intercambio com o novo mundo descoberto. O Renascimento também abriu campo para se pensar em compreender o ser humano per se.

A antropologia inicialmente foi estudada pelos chamados antropólogos de escritório. Esses antropólogos recebiam na metrópole as cartas e relatos dos navegantes, comerciantes e missionários que estavam em contato com esses povos e com base nesses documentos formulavam explicações e teorias antropológicas.

Foi somente no final do século XIX que se percebeu a necessidade de se pesquisar com o pesquisador no próprio campo de pesquisa. O pesquisador deixa então seu gabinete de trabalho para entrar em contato com não mais os informadores a serem questionados, mas com a própria cultura e através da convivência encontrar a base do seu estudo. Ele é agora como um aluno e o povo os mestres. Ele vai aprender a se comportar como eles, a falar a sua língua, a pensar nesta língua, a sentir suas emoções como eles. Esta prática é conhecida como etnologia. Dois destacados etnólogos é um americano de origem alemã chamado Francis Boas e um polonês naturalizado inglês chamado Bronislaw Malinowski.

Outro ramo influente e amplamente estudado da antropologia é a antropologia biológica. Essa antropologia fundamenta-se no evolucionismo de Darwin. Ela se ocupa principalmente em estudar o homem através de comparações com outros animais principalmente os primatas. Consiste basicamente na observação das formas com que os animais comportam em grupo e da estruturação social.

Atualmente a antropologia tem se proposto a estudar também o comportamento do homem na sociedade pós-moderna nas grandes cidades. Os problemas estudados relacionam com as questões das tribos urbanas, da crise de identidade e relacionamentos entre pares.

Tendo em vista que a antropologia cristã é a doutrina do homem no que tange a Deus, podemos considerar que ela sofreu duas grandes transformações. A primeira, quando o cristianismo suplantou a visão grega da realidade, quando passou do estudo do cosmo para Deus. E a segunda ocorreu na época moderna em conseqüência da secularização e do ateísmo, essa é a transição da atenção no estudo que antes estava em Deus posteriormente passou para o homem. Nesse segundo momento o homem passou a ser o centro das atenções dos estudos da filosofia, teologia e deu a direção para toda a ciência.

I.2.b – História da Antropologia Cristã

A antropologia bíblica tem sua origem em Adão. Ali no Jardim do Éden, Adão e Eva receberam uma identidade (o self) pelo próprio Deus. Eles tiveram o entendimento sobre o que era o ser humano com todas as suas atribuições, sejam elas naturais ou espirituais. O constante contato com Deus os fazia conhecer-se a si mesmo. Deus também deu um propósito para a existência a eles (concomitantemente a toda humanidade) no mundo criado por Deus:

Frutificai e multiplicai-vos, e enchei a terra, e sujeitai-a; e dominai sobre os peixes do mar, e sobre as aves dos céus, e sobre todo o animal que se move sobre a terra. E disse Deus: Eis que vos tenho dado toda a erva que dá semente, que está sobre a face de toda a terra; e toda a árvore, em que há fruto de árvore que dá semente, ser-vos-á para mantimento. E a todo o animal da terra, e a toda a ave dos céus, e a todo o réptil da terra, em que há alma vivente, toda a erva verde será para mantimento. E assim foi. E viu Deus tudo quanto tinha feito, e eis que era muito bom”. (Gn 1:28-31).

Como vemos no texto áureo da Criação em Gênesis, Deus cria o mundo e o entrega nas mãos do homem. Ou seja, Deus traz à existência do nada o mundo, para trazer posteriormente criar o homem para nele viver e dominar sobre ele, e poder relacionar-se com Deus e no seu propósito final de Seu Plano Eterno adotá-lo como filho através de Cristo.

I.3 – História da Antropologia Missionária

Como foi dito pelo Pr Prof. René Pereira Feitosa, nas aulas de Antropologia Missionária na ESMI, a Antropologia Missionária surgiu com Abraão na sua saída de Ur dos Caldeus para a terra que Deus lhe mostraria. Ali encontramos o primeiro missionário transcultural. Abraão já era bênção em Ur dos Caldeus, porém Deus tinha uma missão maior para Abraão. Ele atravessou por vários paises entre o Tigre e o Eufrates, entre eles Ur, Padã Arã, Egito e Salém e manteve contato com vários povos na sua jornada. Em todo o momento ele foi uma testemunha do monoteísmo e de Javé.

No Novo Testamento temos o exemplo de Paulo ao pregar no Areópago utilizando estratégias antropológicas para o trabalho missionário. O apóstolo demonstrou estar preparado para pregar à qualquer cultura através de seu sucesso como “apóstolo dos gentios”. Paulo usou um elemento presente na religião grega para fazer referência ao Deus Criador. Do “altar ao deus desconhecido”, Paulo levanta toda a sua argumentação sobre o Deus criador dos céus e da terra que enviou seu Filho ao mundo para salvá-lo (At 17:24).

Outro exemplo Paulo aos utilizar elementos da cultura é a pregação aos cretenses. Em Tito 1:12-13 vemos: Um deles, seu próprio profeta, disse: ‘Os cretenses são sempre mentirosos, bestas ruins, ventres preguiçosos’. Este testemunho é verdadeiro. Portanto, repreende-os severamente, para que sejam sãos na fé.”. Paulo chama Epimênedes de profeta, reforçando a autoridade do profeta cretense e ao fazê-lo reforça a autoridade da Palavra frente ao contexto do povo.

I.4 – Relação de Antropologia e missões:

Por muitos anos ambos os lados têm se beneficiado pelas suas contribuições mútuas. As duas áreas somente se dissociaram após a chegada do pós-modernismo e da escola de Frankfurt, a partir de 1968 na antropologia.(nessa ciência). As contribuições de missionários com a antropologia foram de grande importância para a mesma, pois os relatos dos seus dados serviram de embasamento empírico para a formulação de várias teorias. Os exemplos são muitos, mas se destacam E.B tylor (1832-1917), na América do Norte, Sir J.G.Frazer (1854-1954), na inglaterra e I.H.Morgan (1818-82), nos EUA.

I.5 – Atualidade

Em 1906 iniciou-se a famosa revista Anthropos através de Wilhelm Schimidt (1868-1954) de Viena, ela serviu de benção para todos os missionários europeus. Trazia a realidade dos campos missionários e relatos de estratégias dos missionários e conteúdo bíblico antropológico. Um dos primeiros antropólogos missionários foi o inglês Edwin Smith, filho de missionários na África. Depois da Segunda Guerra fundou a Wycliff Bible Translators. Fundou seu departamento antropológico o Instituto Lingüístico do Verão. No Século XX, a Antropologia Missionária teve contribuintes Eugene Nida, que era secretário executivo da Sociedade Bíblica Americana entre outros.

A antropologia cristã atual se configurou como de fundamental importância principalmente devido à demanda do trabalho prático missionário. Nos últimos séculos a igreja cristã despertou para a sua responsabilidade missionária frente aos desafios do Novo Mundo. E através das experiências acumuladas dos próprios missionários nos campos, pôde-se formar uma coletânea de fundamentos teóricos e práticos que possibilitasse que os futuros missionários tivessem exemplos anteriores e conceitos que ajudariam a trabalhar em contextos transculturais.

Por isso quando falamos em Antropologia Missionária, nos referimos à Antropologia Cultural no horizonte da responsabilidade e realidade missionária. Louis J. Luzbetak define a Antropologia Missionária como: “a forma específica da antropologia cujo alvo é missionário e cujo método é antropológico. A antropologia missionária fornece os métodos científicos enquanto que a missão oferece os exemplos práticos” (REIFLER, Hans Ulrich. Antropologia missionária para o século XXI. Londrina: Descoberta Editora LTDA, 2003, PAF 17). Portanto a Antropologia Missionária surgiu para dar as ferramentas ao missionário cristão para a evangelização trans-cultural.

O que a Antropologia Cristã moderna tem se proposto a fazer é dialogar com os pastores e missionários, buscando apresentar maneiras que respeitem a subjetividade do sujeito e de sua cultura e ao mesmo tempo não se torne complacente com o pecado. Desde as grandes metrópoles até às tribos mais pequenas são alvos de estudo da atual antropologia cristã.

I.4 – Ênfase em missões

A reflexão sobre o ser humano que a Antropologia Cristã vem trazer, tem como seu centro direcionador a prática de missões tendo em vista os conceitos bíblicos e teológicos. Tem seu destacado papel no âmbito de treinamento missionário por possibilitar preparação para amenizar o máximo possível os choques culturais e oferecer estratégias para serem usadas nos contextos específicos. Certamente não existe uma única forma de fazer missões porque cada povo ou grupo é único, bem como se diz o mesmo sobre os missionários. E é essa realidade que também é preciso ser apresentada e oferecer maior possibilidade para o próprio missionário encontrar a maneira de falar ao povo que foi enviado.

5 comentários:

Unknown disse...

Olá,
Acabo de conhecer seu blog e li um artigo muito interessante sobre antropologia cristã. Estou cursando um doutorado em antropologia e desenvolvendo um trabalho relativamente ligado a esta área, gostaria de saber se você é antropólogo e se teria disponibilidade para conversar um pouco sobre o assunto.

Atenciosamente,
A. Agnes

Alexandre Tochetto disse...

Desculpe a demora Alice! E que demora! Mas não sou antropólogo. Sou teólogo, com ênfase em missões e estou no final do meu curso de psicologia na UFMG também. Se ainda precisar, ou querer falar mais comigo sobre o assunto, me coloco a disposição!
Abraços

Unknown disse...

estive lendo seu artigo e gostei muito do link feito sobre antropologia e missões. parabéns!

Oziel Almeida disse...

Muito bom o trabalho! Posso usa-lo coma material no Curso Básico em Teologia Irmão?

Lu Salmasi disse...

Olá, Alexandre!

Estudei sociologia há algum tempo, com ênfase em antropologia. Sou cristã e envolvida com missões. Hoje estou no 3° ano de psicologia em São Paulo. Gostei da sua pesquisa.

Eu gostaria de saber se essa pesquisa é sua e a bibliografia que você usou.

Luciana